Pedro Schiavon | 08/08/2023 | 0 Comentários

FILIAL

* Estabelecimento Fechado

Sabe essas noites que você sai caminhando sozinho, de madrugada, com a mão no bolso, na rua? Nessas noites, inevitavelmente você ia parar no Filial, templo da boemia da Vila Madalena que mantinha, com alma e coração, a dignidade de ficar aberto durante a madrugada.

O Filial brotou no meio do bairro no ano 2000, fruto do investimento dos irmãos Ricardo, Arnaldo, Ronen e Helton Altmann, proprietários dos saudosíssimos Clube do Choro, Gargalhada e Vou Vivendo (Ai, Vou Vivendo, cada tauba que caiu doeu no coração!), e seu nome vem daí mesmo, da ideia de ser uma filial dos três extintos bares.

– Garçom, uma cerveja!

– Só tem chopp!

– Desce dois, desce mais! Afinal, esse foi o propósito inicial do bar. Naqueles tempos, só se tomava cerveja por ali. Por incrível que pareça, não havia um bom chopp em toda a Vila Madalena! Foi o Filial que trouxe para o bairro a cultura do chopp bem tirado, cremoso, em copo adequado e tudo mais, do jeito que hoje estamos confortavelmente mal-acostumados. Era impossível tomar um só, mesmo que se intercalasse com as caipirinhas, sobre as quais é melhor nem comentar.

– Amor, pede uma porção de batata frita?

Podíamos até pedir, mas seria um desperdício de oportunidade gastronômica, afinal, Elenice Altman, esposa do Helton, transformou a cozinha do Filial em uma espécie de Meca dos amantes da tradicional comida de botequim.

É difícil explicar, mas dá para traduzir como uma espécie de “alta gastronomia de boteco”, com petiscos como a irrecusável tigelinha de siri com farofa de dendê, e pratos para apetites mais corajosos, como a clássica moelada, que passava horas de molho em vinho branco seco, alho, sal e louro, era refogado com tomate, cebola e pimenta, e chegava à mesa em uma frigideira de ferro – aí sim com batatas fritas.

Como contam os donos da casa, “os boêmios não demoraram a perceber que ali eram muito bem acolhidos. Foram ficando até às 3h, estenderam-se até às 4h, ensaiaram permanecer até às 5h e, finalmente, vendo que ninguém se opunha, começaram a passar das 6h. Depois, mais à vontade ainda, inventaram não de sair, mas de chegar ao bar com o galo cantando na rua”.

E lá estavam. E lá ficaram, pois o Filial era um dos últimos ícones de uma espécie de bar em extinção, daqueles que representam uma cidade que sempre teve orgulho de sua rica madrugada. Um símbolo de uma São Paulo que não existe mais.

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