CARLINO

Texto do livro “50 restaurantes com mais de 50 – 5 décadas da gastronomia paulistana”, de Janaína Rueda e Rafael Tonon

O ano de fundação – 1881 – comprova: é o restaurante mais antigo em atividade de São Paulo. Mesmo descontados os três anos que permaneceu fechado – uma pausa felizmente interrompida pelo empresário Antônio Carlos Marino, em 2005 –, basta fazer a soma: são mais de 130 anos em pleno funcionamento ou, dissecando ainda mais, cerca de 47 mil dias com as portas abertas para os clientes. Um feito inédito na cidade! O Carlino é um símbolo de resistência de uma cidade que não sabe lá muito bem preservar a sua história, principalmente gastronômica, diante dos apelos dos novos restaurantes da moda que inadvertidamente foram surgindo, levando o público para outros bairros.

Instalado no Largo do Paissandu – mesmo local onde hoje estão as Grandes Galerias –, o restaurante de comida toscana foi batizado por seu proprietário, o italiano Carlo Cecchini, com o apelido pelo qual ele próprio era conhecido pelos amigos: Carlino. Restaurantes ainda eram uma relativa novidade nas cidades brasileiras da época, mas o Carlino obteve sucesso graças ao contingente de imigrantes italianos que habitavam a capital paulista. Cecchini tocou o negócio ali com galhardia até 1949, servindo receitas-lembranças que ele mesmo fazia, como o cordeiro alla cacciatora, o coelho ao funghi e o maccheroncini com frutos do mar. A administração passou, então, para Marcello Gianni, que, em 1960, transferiu o restaurante para o número 141 da Avenida Vieira de Carvalho, no Largo do Arouche, local que se tornou referência por abrigar grandes restaurantes da época (como Fasano e Rubaiyat).

Em 1978, Gianni passou a administração para as mãos de Antônio Carlos Marino, que manteve o restaurante aberto até 2002, quando não resistiu à decadência do Centro e fechou as portas. Os ambulantes e a fumaça dos “churrasquinhos de gato” que dominaram a avenida acabaram por afastar os clientes. Três anos depois Marino decidiu voltar à cena, por persistência, resgatando a história do lugar que primeiro despertou a paixão dos paulistanos pelas massas, pelos risotos e pelas carnes da culinária italiana, mantida até hoje.

O Carlino funciona na Rua Epitácio Pessoa, numa travessa próxima ao Copan, uma porta que passaria quase despercebida não fosse a lousa na calçada anunciando os destaques da cozinha, como o polpettone di picanha recheado de mozarela, que figura certamente como um dos melhores da cidade – apesar de outras casas terem ganhado injustamente essa fama.

O salão simples, de pé-direito baixo, é pequeno para carregar tanta história. Ali estão sempre Marino e seus filhos, Bianca e Bruno, que seguem o legado do pai: ambos começaram a estudar gastronomia, um importante indício de que o Carlino talvez deva se manter funcionando por mais alguns bons anos, quem sabe décadas. Diariamente, sentam-se juntos para comer, conversar e, claro, discutir, como bons italianos. Marino já cogitou ir para outro bairro, mudar de vizinhança, mas no fundo, no fundo não vê chances de sair dali. O Centro falou mais alto.

O livro traz, na sequência, uma suculenta receita do Polpetone de Picanha do Carlino. Mas, nesse caso, só no livro mesmo, ok?

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